O que a Terra dá, a Mesa acolhe: a beleza da Cozinha Simples
Vânia
Viver perto da fronteira é viver entre tradições partilhadas, onde os sabores se cruzam e se complementam. A tortilha de batata, esse clássico espanhol, é um desses exemplos. Do outro lado da fronteira, é um prato essencial, preparado com poucos ingredientes e cozinhado sem pressa. Mas por aqui também a apreciamos, talvez porque nos lembra a comida de verdade – aquela que se fazia antigamente, sem artifícios, apenas com o essencial.
Se há algo que espanhóis e portugueses têm em comum, é o respeito pela comida simples e bem feita. Eles deliciam-se com o nosso bacalhau, os nossos ensopados e as nossas migas, e nós, por nossa vez, adotamos algumas das suas receitas, incorporando-as na nossa cozinha sem que muitas vezes nos apercebamos disso. Afinal, bons sabores não conhecem fronteiras.
O mesmo acontece com os ingredientes que a terra nos dá. Quem já percorreu os campos na primavera sabe a alegria de encontrar espargos selvagens, finos e ligeiramente amargos, prontos para serem colhidos e levados diretamente para a cozinha. Com ovos batidos e um pouco de azeite, fazem uma tortilha deliciosa, daquelas que sabem à terra onde crescemos.
Hoje, no meio de tantas opções e modas alimentares, parece que nos esquecemos de que uma alimentação saudável pode ser incrivelmente simples. Vamos acumulando ingredientes difíceis de pronunciar e receitas cheias de passos desnecessários, quando, na verdade, os pratos mais antigos – aqueles que as nossas avós faziam sem grandes complicações – são muitas vezes os mais equilibrados. Um bom azeite, ovos caseiros, batatas da terra. E paciência para cozinhar sem pressa.
Afinal, é isso que torna a comida verdadeiramente especial: a simplicidade à mesa, o respeito pelos ingredientes e a alegria de partilhar um prato que atravessa gerações.
Receita
Ingredientes:
2 Batatas brancas pequenas
6 Ovos
2 Colheres de sopa de azeite
7 Ramos de Espargos selvagens
Sal a gosto
Dia: A receita pode ser feita apenas com a batata ou substituindo os espargos por cebola cortada finamente em meias luas.
Instruções:
Comece por descascar e cortar a batata em rodela bem finas, pode usar uma mandolina para facilitar.
Lave e pique os espargos.
Coloque o azeite num frigideira de tamanho médio.
Salteia as batatas e os espargos em azeite por 5 minutos.
Parta os ovos e bata até ficar homogêneos. Se desejar pode temperar os ovos com sal a gosto.
Coloque os ovos batidos na frigideira sobre as batatas e os espargos.
Deixe cozer em lume baixo sem mexer. Tape com uma tampa para que coza de forma uniforme.
Desenforme a tortilha depois de arrefecer. Coloque um prato sobre a frigideira e inverta a frigideira de forma que a tortilha fique no prato.
Sirva com salada.
Fazer uma tortilha de batata ou juntar-lhe espargos selvagens apanhados no campo é mais do que simplesmente cozinhar—é um gesto de respeito pelas tradições e pela simplicidade da boa comida. Entre Portugal e Espanha, os sabores cruzam-se, enriquecem-se e lembram-nos de que a cozinha mais autêntica é aquela que nasce da terra e da sabedoria de quem veio antes de nós.
Num mundo onde a alimentação parece cada vez mais complicada, voltar às receitas antigas é um ato de reconexão. Porque, no fundo, não precisamos de ingredientes exóticos ou técnicas elaboradas para fazer um prato que nos sacia e nos conforta. Apenas de bons produtos, um pouco de paciência e a vontade de cozinhar com prazer.
Que esta receita te inspire a desfrutar da cozinha sem pressa, a saborear cada garfada e a celebrar a simplicidade dos sabores de sempre. Afinal, é na mesa, partilhando pratos como este, que as melhores histórias se contam.
O Pão feito em Casa: Tradição, Sustento e Aconchego
Vânia
O pão foi, durante séculos, a base da alimentação de muitas famílias. Em tempos de escassez, quando os recursos eram poucos e a fartura não era garantida, um simples pão tinha de alimentar bocas famintas e durar o máximo possível. Havia um respeito profundo pelo pão, pelo trabalho das mãos que o amassavam e pelo tempo que se dedicava ao seu crescimento. Fazer pão em casa não era um luxo, mas uma necessidade – uma tradição que unia famílias em torno do forno e do sustento partilhado.
Hoje, fazer pão em casa pode parecer um ato romântico, quase mágico. Há algo de profundamente reconfortante em sentir a farinha entre os dedos, em misturar a água e o fermento, em amassar com paciência e ver a massa crescer, como se tivesse vida própria. O cheiro do pão quente a sair do forno é um convite a sentar à mesa, a cortar uma fatia generosa e a saboreá-lo devagar, ainda morno, com um fio de azeite ou uma colher de mel.
E mesmo depois de passado o encanto do pão acabado de cozer, há uma beleza na sua durabilidade. Antigamente, nunca se desperdiçava nada. O pão do dia anterior era torrado, o mais duro era ensopado em sopas de pão ou migas, e as últimas migalhas davam sabor a caldos e pratos humildes. Nada era perdido, porque tudo tinha valor.
Hoje, partilho contigo uma receita de pão alentejano caseiro, inspirado nesse respeito ancestral pelo pão e pelo seu significado. Que possas amassá-lo com calma, vê-lo crescer com paciência e saboreá-lo com gratidão.
Receita
Ingredientes:
500 gramas de farinha de trigo sem fermento do tipo T65
300 ml de água morna
10 gramas de sal integral grosso
6 gramas de fermento de padeiro
Instruções
Aquece a água ligeiramente. Esta deve estar morna.
Pesa o sal e o fermento.
Coloca na água morna o sal e o fermento e mexe até ambos de desfazerem.
Pesa agora a farinha de trigo.
Abre um pequeno orifício no centro do recipiente onde está a farinha e verte a água com o sal e o fermento para o centro da farinha.
Mexe com uma colher até a massa aglomerar toda.
Transfere para uma bancada limpa e com as mão, também limpas, começa a amassar.
Amassa por 15 a 20 minutos à mão ou por 10 minutos na máquina. Este passo é importante para que o pão fique suave, pois ativa o glúten.
No final de amassar coloca a massa no recipiente com farinha para não colar.
Deixa levedar por 2h a 3h num ambiente ameno com um pano por cima.
Transfere novamente o pão para a bancada e sem o manipular muito cortar a massa em 2 metades e moldar duas bolas
Coloca os 2 pães num tabuleiro de forno forrado com papel vegetal.
Deixa que volte a levedar por mais 15 a 30 minutos, tapado com um pano.
Coloca no fundo do forno uma tigela que possa ir ao forno com água. A água vai ajudar a que a crosta do pão fique crocante.
Leva o tabuleiro com o pão ao forno pré aquecido a 200ºC por 50 minutos.
Retira o pão do forno quando estiver dourado e deixa arrefecer numa grelha para que o arrefecimento seja uniforme. Corta quando estiver morno ou frio.
Esta receita de pão alentejano traz consigo a simplicidade e o sabor tradicional desta região rica em história e cultura. Ao seguir cada passo, conseguimos ressuscitar a alma rústica e autêntica do Alentejo, com um pão crocante por fora e macio por dentro, perfeito para acompanhar as refeições ou simplesmente para saborear com um bom azeite. O resultado é um pão caseiro, feito com carinho e paciência, que traz à nossa mesa o verdadeiro sabor do interior de Portugal. Com esta receita, é possível sentir-se em casa, seja na aldeia ou na cidade, sempre em sintonia com a tradição do campo.
Esta receita traz consigo memórias especiais da minha infância. O meu avô era comerciante de peixe e, sempre que podia, trazia-me as maiores ovas de bacalhau que alguma vez já vi. Ele sabia que eu adorava e, com esse carinho, transformava qualquer dia comum num verdadeiro banquete. Lembro-me de me sentar à mesa, radiante, saboreando cada pedaço e sentindo-me mimada pela sua atenção — e, ainda hoje, continuo a adorar o sabor único das ovas.
Além de deliciosas, as ovas de bacalhau são um alimento nutritivo e cheio de benefícios: ricas em proteínas de alta qualidade, vitaminas do complexo B, especialmente B12, e ácidos gordos essenciais, contribuem para a saúde do coração, do cérebro e fortalecem o sistema imunitário. Nesta salada, combinam na perfeição com o couscous, o grão e o ovo cozido, criando um prato equilibrado, colorido e cheio de sabor — e também de memórias afetivas.
Ingredientes (para 4 doses)
1 ova de bacalhau grande – fresca ou previamente descongelada, para cortar em pedaços após cozer.
1 chávena de couscous – cru, pronto para hidratar com água a ferver.
1 chávena de brócolos – cortados em pequenos floretes.
2 cenouras médias – descascadas e cortadas em cubos ou rodelas pequenas.
1 chávena de grão-de-bico cozido – pode ser caseiro ou de lata, bem escorrido.
1/2 cebola roxa – finamente picada para temperar a salada.
2 ovos – cozidos e cortados em pedaços.
Coentros frescos – a gosto, picados para aromatizar.
Sal – a gosto, para temperar couscous, legumes e salada final.
Azeite virgem extra – a gosto, para temperar no final.
Vinagre – a gosto, de preferência de vinho ou de maçã, para equilibrar os sabores.
Modo de preparação da Salada de Couscous com Ovas de Bacalhau, Grão, Ovo e Legumes
Cozer a ova: Levar a água a ferver e colocar a ova de bacalhau para cozer por cerca de 15 minutos. Depois, retirar e deixar arrefecer um pouco antes de cortar em pedaços.
Preparar o couscous: Colocar o couscous numa tigela, temperar com uma pitada de sal e verter água a ferver até cobrir. Deixar absorver e soltar os grãos com um garfo.
Cozinhar os legumes: Cortar os brócolos e as cenouras em pedaços pequenos. Cozer em água com sal até ficarem macios, mas ainda firmes.
Cozer os ovos: Assim que a água levantar fervura, colocar os ovos com casca e deixar cozer por 6 minutos. Depois de cozidos, arrefecer, descascar e cortar em pedaços.
Preparar os temperos: Picar a cebola roxa e os coentros.
Montar a salada: Numa taça grande, colocar o couscous, a ova em pedaços, os legumes, o grão-de-bico e os ovos cortados. Adicionar a cebola roxa picada e temperar a gosto com coentros, azeite e vinagre. Ajustar o sal se necessário.
Servir: Esta salada pode ser servida quente ou fria, conforme a preferência.
Esta salada de couscous com ovas de bacalhau, grão e ovos é muito mais do que um prato saboroso: é uma celebração de memórias afetivas, simplicidade e saúde. Cada ingrediente combina textura, cor e nutrientes, oferecendo uma refeição equilibrada e cheia de sabor. As ovas de bacalhau trazem proteínas de qualidade, vitaminas e ácidos gordos essenciais, enquanto o couscous, os legumes e o grão completam uma refeição leve, nutritiva e reconfortante. Pode ser servida quente ou fria, perfeita para partilhar em família ou para desfrutar num dia de semana sem pressas, mantendo sempre a essência mediterrânica de proximidade, sazonalidade e carinho à mesa.